sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Não tenho tempo (Desabafo - Parte II)

(Foto por: Mariana Barreto)
  


  A Apple bem que podia inventar um novo aplicativo para coçar as costas, do jeito que ando não tenho tempo pra isso. Não deu tempo nem de olhar direito o nascer do sol, que estava lindo, nem pro passarinho que estava cantando na minha janela. Já eram 6:35h da manhã, eu pego carona às 6:40h, tenho 5 minutos para correr do elevador até o prédio de minha amiga. Pegamos um engarrafamento de mais ou menos 10 minutos, temos mais 5 minutos para sair do carro, correr pelo portão, passar pela portaria e voar até a sala, pra chegar antes do professor, temos uns 2 minutos pra escolher o melhor lugar na sala, cumprimentar todo mundo, e quando nos damos conta já deu 7h e a aula vai começar. Passamos a manhã inteira correndo, copiando rápido o assunto que está no quadro, anotando rápido na agenda os deveres para a próxima semana, resolvemos rápido as questões de física, não lemos o enorme texto de sociologia, nem deu tempo do professor de literatura citar mais exemplos da terceira geração do Romantismo. Pra falar a verdade não deu tempo de lanchar, tive que enfiar todos os biscoitos de vez na boca, pra depois correr no banheiro e no bebedouro... ainda cheguei atrasada na penúltima aula. Aliás, nem ví que o tempo passou tão rápido, nem ví que já estava naquele colégio há mais de 4 horas. Nem deu tempo de olhar no relógio. Nem deu tempo de avisar pra todo mundo que, do fundo do meu coração, eu não queria estar alí, que eu realmente preferia estar por aí, vivendo, fazendo coisas mais importantes que saber que o trabalho de uma força peso é o valor da massa vezes o valor da gravidade, vezes a altura. Esquecí de dizer pro professor que eu nunca calculo o módulo do trabalho do meu peso quando subo as escadas do meu prédio. Será que ele tem tempo de ficar calculando a força do trabalho que o motor do carro dele faz? Será que eu sou a única pessoa que conseguiu sobreviver 16 anos sem saber que as células cartilaginosas são binucleadas? Será que quando eu estiver entrando num ônibus o cobrador vai perguntar: "Thomas Hobbes era teórico absolutista ou liberalista?". Ou será que quando eu pedir um suco numa lanchonete a garçonete vai me perguntar qual a quantidade de mol de H2O que eu quero? Imagine se uma mulher grávida estivesse chegando no hospital pra ter filho e o médico dissesse: "Olha, só poderei fazer o seu parto depois que você responder essa pergunta básica: Qual a diferença entre os pequenos e grandes lábios?". Será que o mundo tem tempo pra tanta informação, será que conseguiremos acompanhar essa rapidez, essa velocidade desastrosa? Será que ainda temos tempo pras coisas simples? Ainda dá tempo de cantar no chuveiro? Mal temos tempo para nós mesmos, que acabamos não vendo o que acontece ao nosso redor, não dá pra viver os momentos, não dá pra viver os lugares. Tudo passa voando, mas cortaram nossas asas.

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