quinta-feira, 28 de junho de 2012

Registro de uma mágoa

  Eu não entendi nada. Sempre estive tão acostumada em ser enganada e me enganar também, para poupar-me de alguns acontecimentos desprezíveis. Eu já sabia que ia dar nisso, claro. Estou escrevendo apenas para deixar registrado que eu tenho noção dos fatos. Impressionante a minha capacidade ilimitada de descobrir o que não quero, de desvendar segredos que eu fazia questão de não saber. Eu vejo tudo, de olhos fechados. E por achar que minha vista alcança todos os cantos do mundo, eu pensei que não teria nada que eu não soubesse. Me enganei, pra variar. É notável o meu desapontamento. Esse texto é apenas para desabafar a minha raiva sem medida. Esse texto é um tapa na minha cara. Escrevo, enquanto sinto cada pedaço do meu corpo rindo de mim. Lamentando o meu romantismo exageradamente burro. Acabo de sentir todas as minhas veias explodindo e jorrando sangue de desgosto sobre a minha face esquecível. Aproveite o momento e ria de mim você também. Mostre os seus dentes afiados, solte uma daquelas gargalhadas apaixonantes. Vamos. Quero ver você rir na minha frente. Vamos acabar de uma vez por todas esse prazer em apenas degustar. O medo de comprar o saco inteiro de feijão, o medo de enjoar do mesmo tempero. O medo. Sair correndo para não esquentar o lugar, para não criar raízes. Não se apegar pra poder voar. Mas um dia cansa de ser livre e não tem para onde voltar.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Não sou daqui, ainda bem.

   Acordei agora. Nem abri as cortinas ainda. Nem vi se o sol apareceu hoje. Chuva. Acabei de ver. Mas como está chovendo se ontem fazia um sol lindo? Como o sol foi embora sem nem se despedir? Mas não me atrevo a falar de despedidas. Foi bom ele ter ido sem falar nada, porque não fica a ansiedade do retorno. Porque nem tudo que vai volta. Ou volta, mas não do mesmo jeito, nem pro mesmo lugar. Eu fui. Voltei. Mas já quero ir de novo. É como uma fuga viciante. É liberdade. Indescritível. O caminho é percorrido com os pés de quem sabe que ali é um dos melhores lugares para esquecer o mundo. Nada existe, ninguém existe. Nem eu. Esqueci de falar que eu não existo mais. Morri, sabia? Estou indo para outro planeta, porque ficar aqui dói. Todo mundo sente dor um dia. Eu sinto vários dias. E quase me engasgo com o que sinto, porque não posso dizer. Vivemos aonde? Aqui todo mundo é triste sempre, por não poder falar que está triste um dia. Ter que sorrir sempre é como pegar uma faca e enfiar na própria barriga. Você deixa a faca lá, fingindo que não está doendo e quando fica sozinha arranca o objeto com tudo e sente aquele ardor, misturado com alívio. Então você sorri, porque finalmente pode admitir que estava doendo. Por favor, vamos admitir que ser humano dói. Ou será que eu não sou dessa espécie e não consigo me acostumar com tantos sentimentos? Será que todo mundo é normal e a estranha aqui sou eu? Será que todo mundo sente o básico e eu que vou além, com um coração mole, procurando amor? Estou no lugar errado, tenho certeza. Finalmente descobri que não sou desse planeta. Me perdoem, mas não sei matar. 

domingo, 24 de junho de 2012

Uma bagunça

  Pode ir na frente, que eu também já vou. Na verdade, mente. Não sei aonde estou. Queria dizer que eu não vou mais. Embora ainda olhe para trás. Queria te contar que o sonho está por um triz e que tudo pode se desmanchar em alguns segundos. As cores aqui já se foram e esse frio fez meu coração hibernar. Não vou falar da saudade e ainda que Chico fale que a saudade é o pior tormento, é pior do que o esquecimento, é pior do que se entrevar, ainda acredito que é muito pior que tudo isso junto. E qualquer palavra utilizada aqui para tentar expressar essa dor seria em vão. Inútil. Dor desnecessária, eu diria. As palavras fugiram de mim, mas não posso fugir do que minha mente me obriga a escrever. Solidão, como um vagão de trem esquecido em uma velha estação. Um rádio que não funciona mais, um jornal impresso que ninguém mais lê, uma vitrola velha que não toca. Guardei o mapa, talvez eu passe ai mais tarde, só pra ter certeza que você já foi. A sua ida foi a pior saída, deixando sem vida as flores do jardim. "Não quero mais ficar aqui!"- eu gritei. Mas ninguém ouviu. Eu estava só.

domingo, 17 de junho de 2012

Uma viagem rápida

   Lamento. Foi a única palavra que apareceu na minha mente agora. Respirei. Respirei mais uma vez. Há tempos tinha parado de notar em como respirar é lindo. Meus olhos estavam olhando ao redor, procurando-me. Desejo-me de volta. Minha alma implorou o meu retorno. E eu voltei, correndo, perdida. Esquecida. Esqueceram de mim no meio do caminho, na beira da estrada. Morrendo de sede. Não me falaram que a viagem era curta. Pensei que íamos de foguete, já estava sonhando até com a lua. Mas me enganei e o engano é cruel, na maioria dos casos. Foi por acaso que subi nesse trem, não sabia nem pra onde ia. E o maquinista não me avisou que alguns lugares estavam sem trilho. Tive que descer, ainda com o trem em movimento. Sem querer admitir que a viagem estava sendo ótima e que por mim eu continuaria lá. Não pude falar nada, claro. Seria fraqueza demais admitir isso assim, na cara do motorista, com todos os outros passageiros me olhando. Minha cara devia estar ótima, devia ser uma daquelas que eu faço ao me despedir de algo que me apeguei e não consigo largar. Mas também não sei dizer que quero ficar. Tive que sair andando, acenando com uma das mãos o adeus que eu não queria dar. Ainda me restava o livro. Uma luz no fim do túnel. Não andei mais naquela rua, era perigoso demais. Em todos os sentidos. Mas o perigo era imenso, em qualquer parte do mundo. Agora eu estava sozinha e as luzes da cidade não conseguiam clarear tamanha escuridão. Os meus pés já nem sabiam para onde queriam ir. Eu sabia. Exatamente, com todas as letras e os mínimos detalhes. Sabia de cor e salteado. Sabia de todas as formas, de todas a maneiras. Tinha o mapa gravado na minha cabeça. Mas agora eu estava longe e já era tarde demais. Lamento.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Querem tudo, mas não querem nada

  É uma pena. Ter pena de quem não merece. Merecer o que não tem e não ter nada além do que não é seu. Ser seu e não se pertencer, não se governar. A culpa é do medo. Simples. Parece fácil, parece. E é fácil. Jogar a própria culpa em cima do primeiro que aparecer. Buscar alguém pra levar o peso por você. Sair de baixo quando não aguentar, ser fraco porque sabe que alguém vai segurar. Olhar com cara de vencedor, mas só perdeu na vida. E acha que está ganhando. O tempo vai passar e mostrar que não é por esse caminho que se chega lá no topo. Não é por aí que vence. A vida é muito mais inteligente do que a gente imagina. Ainda bem. Sábios são aqueles que prezam seus princípios e sabem aonde querem chegar, são aqueles que querem chegar e fazem isso acontecer. Acontece. E o lixo do mundo são aqueles que ficam empoeirados internamente, porque gastam o tempo inteiro cuidando do que está por fora. Embonecando-se diante do espelho como se suas carinhas bonitas fossem eternas. E, ao passar os dias, recebem um tapa da vida e ficam desesperados ao ver seus rostinhos de porcelana quebrando. São tão frágeis, tão fracos, que no primeiro tapinha, quebram-se. São ocos. E de gente vazia o mundo está cheio. Não tenho estômago para aguentar reizinhos achando que são donos do planeta, mas não sabem nem o preço do creme anti-acne que passam na cara.

terça-feira, 12 de junho de 2012

Heróis melados de sangue inocente

  Que direito tem? Até aonde pode ir uma nação sobre a outra? Não deixar o outro ser. Não deixar existir. Existindo o fim, sem ter começo algum. Sem finalidade. A morte na flor da idade. A flor que murchou, sendo ainda uma semente, sem poder germinar. Germinando errado, um defeito dado, premeditado. Ninguém sabia. Eles sabiam. Destruíram a força com força. Ganharam o mundo friamente, injustamente. Amados, idolatrados, fanáticos. Heróis disfarçados. Foi jogo sujo. Foi sujeira pura. Grande porcaria vencer, grande porcaria melar o mundo com sangue inocente. Malditos. Um contra milhares. Um poder. O poder na mão de poucos e outros sem mão. Um sem coração, milhares sem vida. A vida se extinguindo. Uma história queimada e jamais esquecida. A tentativa de destruir o inimigo, o medo de perder. A destruição em massa de sonhos. O crescimento forçado da fé inesperada. A esperança abalada de quem não tinha mais nada. De quem não via mais, não sentia, não andava. Deixaram de existir em segundos, viraram poeira, pó, fumaça, sombra. Nada. Nada mais existia, a não ser a felicidade podre dos adversários e a revolta dos que não tinham noção do que estava acontecendo. Uma explosão, não se sabe de onde, não se sabe porque. A mãe morreu sem poder esperar o filho nascer. A criança cresceu, sem poder crescer, com os ossinhos destruídos, os olhinhos caídos. Viraram cobaias. Eram examinados, testados, estudados. Viraram uma novidade para entreter uma população que só olhava para o próprio umbigo. Uma população armada, que não pensava, só calculava. Foram obrigados a ter uma vida, sem escolha. Um único desejo: viver. "Paz, por favor!" Eram os gritos dos que foram silenciados com o estrondo. Até hoje não conseguem entender porque foram escolhidos para ter morte eterna.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

Dançando, não mais só

  Não falei nada. Era engraçado o momento, porque eu sentia que o meu corpo queria ficar ali pra sempre. E é uma pena ter que obedecer as leis do mundo, enquanto as suas leis internas são divergentes, enquanto o seu mundo tem um movimento de translação oposto. O eixo é outro. O planeta agora gira pra outro lado, em um embalo silencioso, que só se escuta calado. Fala-se pouco, sente-se quase tudo. Muito, eu diria. Ou talvez eu não saiba dizer. Não digo. Apenas escuto o silêncio da nossa respiração, que é tão agradável quanto um esparadrapo enrolado em uma sapatilha velha de ballet. O alívio ao sentir que a ponta do pé não queima mais por estar em contato direto com o chão. A sensação de não estar dançando sozinha no palco. A surpresa ao notar que os passos não foram ensaiados, mas por algum motivo são executados em uma sintonia impecável. A melodia da canção, que acelera o coração de quem dança. A dança que faz as almas bailarem, despreocupadas. A desocupação da mente, ao notar que aquele momento é precioso demais pra pensar em outra coisa. O pensamento que se desliga automaticamente no momento do encontro. O encontro, de quem não estava procurando nada, mas achou.

domingo, 3 de junho de 2012

Já?

  Já vai? O tempo aqui passou voando. Meu relógio foi incapaz de me avisar que já passava de meia noite e o encanto estava acabando. Pobre Cinderela, dormiu no ponto. Normal, desacostumada com príncipes ligeiros. Desacostumada com a correria da vida. Correu e se perdeu nessa aventura obrigatória, que ela achou ser mais uma de suas histórias. Mais uma incompleta para seu livro, que já cansou desses contos pela metade. 

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Mente só

  Cheiro meu. Agora desapareceu. Fugiu, correu. Sem querer, cai. Tropecei, com a cara no chão. Não, não diga: "sabia que ia dar nisso." Uma bagunça infeliz. Ri de mim. Escondido. Amei. Escondido também. Não ligo, nem te digo. Foi um imprevisto. Previsível, clichê. Estava parada. Comecei a andar. Devagar. Andei, andei. Droga, cai. Levantei rindo, disfarçando. Tinha gente olhando, todo mundo vendo. Sorri. Estava mentindo. Não queria dizer que és lindo. Ri novamente. Só mostrando os dentes. Nem te falei que eu não queria ir, com medo de você não chegar.  Nem te expliquei que eu talvez não fosse, porque eu já estava lá. E lá eu fiquei, olhando pra vida, que ria de mim, impiedosamente. E chorei um pouco, só pra regar a alma. Depois ri novamente, enganando a mente, fingindo estar contente.